Neste momento, você provavelmente concorda que a pandemia alterou a vida de todo mundo. Na questão da carreira, ela adiantou o que era chamado como “futuro do trabalho”. Por isso, um dos pensamentos que mais estão presentes na atualidade é o de como desenvolver a carreira em meio a uma crise.
Segundo pesquisas da World Economic Forum, a crise do coronavírus acelerou uma série de tendências relacionadas ao trabalho, algumas, inclusive, estão acontecendo com mais força e velocidade do que o previsto.
Trabalho remoto, automação dos processos e a reavaliação global da economia do cuidado são apenas alguns exemplos. “Toda ação que apenas um humano pode fazer ficou mais valorizada. O cuidado é uma delas. Então, profissões como psicologia, enfermagem, professores e cuidadores aumentarão nos próximos anos”, afirma Talita Cordeiro, consultora especialista em gestão da carreira.
Novas prioridades
Estamos reavaliando muitas coisas durante a pandemia. Parte delas perderam ou perderão muito do seu significado e relevância. Um exemplo disso são as profissões mais valorizadas atualmente, justamente aquelas que possuem mais carga de trabalho e salários nem sempre equivalentes a tanto esforço.
No caso da Gig Economy, ela revela uma realidade do país. Mais de 40% da força de trabalho no Brasil não é do regime CLT, e a situação da pandemia expôs o risco de ter tanta gente sem proteção social.
“Recentemente, esse caso ficou famoso. Como exemplo temos a greve dos motoboys por aplicativo, que não possuem remuneração ou ajuda social em caso de doença ou paralisação do trabalhar. Nos fez pensar: qual é o custo de proteção para esse grupo de trabalhadores?”, comenta Talita.
A pandemia veio para acelerar não só a questão das profissões importantes, mas também a transformação digital, que se tornou parte inseparável do profissional e tem que entrar na lista de objetivos de quem vai desenvolver a carreira.
“Tivemos que aprender a falar online, usar novas ferramentas, automatizar nosso trabalho, colaborar, ter encontros e reuniões digitais. Tudo se virtualizou, inclusive coisas que nunca imaginamos, como missas, reuniões familiares e cursos, que, para muitas pessoas, foi uma novidade”, reforça a consultora.
Valores pessoais
Não existe uma forma de explicar os pontos para desenvolver a carreira sem citar os valores humanos, que também estão mudando.
Valores pessoais são aqueles norteiam nossas decisões ao longo da vida. Segundo Talita, é importante reconhecê-los para entender realmente do que não abrimos mão quando temos que tomar decisões.
Em uma pesquisa da Barrett Values Centre de 2019, honestidade, comprometimento, atitude positiva, família, respeito, aprendizado contínuo e integridade foram os valores apontados como mais relevantes para as pessoas.
No entanto, com o avançar da pandemia, a pesquisa foi refeita. Alguns valores se mantiveram, novos foram acrescentados e a ordem de relevância passou a ser outra.
“O termo ‘fazer a diferença’ apareceu como um valor, sendo a ideia de que somos responsáveis pelo que pode acontecer com o próximo. Outro destaque veio para a adaptabilidade, que não se limita apenas ao cenário das empresas, mas, no mundo VUCA, também é significativa”, relaciona a consultora.
Nas organizações, não é diferente. Antes do coronavírus, elas tinham como valores profissionais:
- Alta performance e engajamento
- Trabalho em equipe e comprometimento
- Práticas restritivas de contenção de custos e controle
Agora, eles passaram a ser:
- Adaptabilidade
- Responsividade para mudanças frequentes
- Foco nas pessoas
- Trabalho em equipe de forma colaborativa
O que pode desenvolver a carreira
Um modelo clássico de desenvolvimento trabalhado por muitas empresas é o 70 – 20 – 10. Basicamente, ele reforça como experiências práticas são valiosas para aprendermos novas habilidades na hora de desenvolver a carreira.
Aqui vai um resumo para entender melhor:
70% do nosso desenvolvimento são de vivências;
20% está diretamente ligado aos relacionamentos (conexão com pessoas);
10% é o treinamento formal, ou seja, a aplicação do que aprendemos em sala de aula para incorporar no nosso repertório.
Neste ano, o Center Creative Leadership divulgou uma pesquisa na qual executivos responderam sobre pontos que trouxeram mais desenvolvimento para a vida deles. O resultado mostrou que o aprendizado vinha:
- 45% de atividades desafiadoras
- 23% de outras pessoas
- 22% de dificuldades
- 5% de cursos
- 5% da vida pessoal
Mas por que os momentos de desafio e dificuldades nos ajudam a aprender?
Para Talita, tanto as dificuldades quanto os recursos que usamos para superá-las promovem o autoconhecimento, aumentam a nossa sensibilidade e compaixão, desenvolvem nossa flexibilidade e possibilitam novas perspectivas.
“Desafios e dificuldades permitem olhar de outra forma para o mundo, com mais compaixão e entendimento sobre a perspectiva do outro. Esse é o convite que faço na hora de desenvolver a carreira, olhar a situação de pandemia e reconhecer o que aprendemos nela”, estimula.
Velocidade da evolução
Tudo passa por evolução, seja o mercado, empresas ou nós mesmos. No entanto, a velocidade como isso acontece é a grande questão. Então, fazer o trabalho do mesmo jeito pode não gerar resultados satisfatórios – não para os padrões atuais.
Por isso é importante ter velocidade de desenvolvimento, inclusive pensando na transformação digital e na antecipação do futuro do trabalho. “Vejo muita gente falando que não sabe lidar e se adaptar a ferramentas novas, sendo que essa é a hora. O convite é aproveitar a imersão digital, entrar nela, errar e se arriscar desde já”, alerta.
No conceito de carreiras modernas, proposto por Douglas Hall, a carreira é percebida nas atitudes e comportamentos associados com experiências do trabalho e atividades durante a vida de uma pessoa. Então, desenvolver a carreira é algo que acontece na percepção individual das experiências, em empresas, em casa ou em outros ambientes.
“Nesse contexto que o Hall traz, carreira também é sinônimo de sentir que progrediu ao fazer o trabalho de forma diferente, aprender novas competências e ser desfiado”, reforça Talita.
Dicas finais
Uma ajudinha extra é sempre bem-vinda. E por isso a consultora listou alguns passos para quem deseja começar a desenvolver a carreira agora mesmo. Anote aí:
Defina objetivos claros de desenvolvimento: eles não podem acontecer por acaso. Faça propostas de novos aprendizados e tente realizá-los para sair dessa experiência transformado.
Reserve momentos para reflexão: esse espaço biológico do desenvolvimento é importante para pensar o que deu certo, o que não deu e o que pode mudar.
Amplie o autoconhecimento: situações difíceis trazem a urgência de aprender mais sobre nós mesmos, de uma forma que não aprendemos em situações normais.
Saiba dosar a autocompaixão e disciplina: esse equilíbrio é importante para o desenvolvimento. Não precisamos ser muito duros e nem deixar de lado a disciplina.
Entenda seus próprios limites: saiba até onde pode ir e em que momento vai precisar de ajuda.
Tenha uma rede apoio: para quem você recorre na necessidade? Aqui entra todo tipo de apoio, seja psicológico, técnico, de carreira, mentor, chefe, família ou alguém de confiança.
Exercite o olhar positivo sobre a situação: não feche os olhos para a realidade, mas saiba que sempre vai ter algum elemento de ganho e aprendizado.
Que tal colocar essas dicas em prática para começar a desenvolver a sua carreira?